Entrevistado pela jornalista Alexandra Prado Coelho, o sociólogo brasileiro Carlos Alberto Dória fala do fenómeno da gastronomia elevada à condição de espectáculo pelos media, que fizeram dos chefs grandes «estrelas» deste universo dominado pelos códigos da distinção, a que toda a gente quer aceder; e fala também da construção simbólica dos «pratos nacionais», determinada por factores históricos, culturais e ideológicos.

Somos o que comemos: esta premissa que estabelece uma relação de equivalência entre identidade e comida é um ponto de partida básico de toda a investigação histórica, cultural e antropológica do autor de Food, Religion and Communities in Early Modern Europe, Christopher Kissane, que foi nomeado em 2016 pela BBC um dos «New Generation Thinkers». Neste artigo, ele traça a história da alimentação na Europa e mostra como essa história se liga à sua história política.

A escritora e jornalista americana Lisa Abend, que escreve regularmente para a revista Time sobre gastronomia, ocupa-se neste artigo da figura do chef, tal como ela se foi construindo socialmente a partir dos anos 90 do século passado, até atingir a condição de estrela, de celebridade e de herói. Essa figura que ganhou um elevado estatuto cultural, social e político, ao ponto de passar a reivindicar um papel que está muito para além das suas funções na cozinha.

Neste artigo, Alexandra Prado Coelho, jornalista especializada nas áreas da alimentação e da gastronomia, coloca a questão do critério moral na alimentação, dos valores axiológicos que projectamos naquilo que comemos, por exemplo, o pão branco e o pão escuro. E mostra como esses valores se transformam e até se invertem ao longo do tempo e se articulam com códigos culturais e sociais.

Arquitecta e autora de importantes ensaios sobre a cidade e a comida, sobre o abastecimento das cidades, Carolyn Steel desenvolveu uma importante problemática em torno do conceito de «sitopia», isto é, do mundo como lugar moldado pela alimentação. No centro da sua análise, está o pressuposto contemporâneo da comida barata, proporcionada por uma indústria agroalimentar que põe em causa o futuro da vida na Terra.

O filósofo e historiador da cultura Thomas Macho, professor na Universidade Humboldt, de Berlim, e director de um centro de investigação em ciências da cultura, da Universidade de Linz, na Áustria, desenvolve neste texto uma questão que percorre a obra cinematográfica de Pasolini: a relação entre a crítica do poder e a lógica metabólica da sociedade de consumo, com as suas representações da comida e da fome.

A relação entre o Hospital e a Cidade é o tema deste «Metropolitano». Daniela Arnaut, arquitecta, professora universitária e investigadora no domínio dos «edifícios de saúde» e dos «espaços de cura», convida-nos a seguir uma história que, muitas vezes, por estar em frente do nosso olhar, se torna invisível. Em tempos de pandemia, este ensaio leva-nos a reflectir sobre questões como a da higiene ambiental, e nele figura uma pergunta: será que estamos perante uma nova ordem no espaço urbano?

No centenário do seu nascimento, evocamos a grande escritora brasileira, de origem ucraniana, Clarice Lispector, olhando o tempo que viveu e vendo como esse tempo se reflectiu na sua obra intemporal. O autor deste ensaio é Ricardo Domeneck, poeta, artista visual e crítico brasileiro que vive em Berlim. Nele, fala-nos surpreendentemente da Clarice «política», se dermos à palavra «política» o inabitual sentido do que está antes e é «prévio à cidade dos homens». A obra de Clarice Lispector está aberta sobre outros mundos e nela as palavras são criadas de novo, assim parece acabada de criar a beleza que nos é mostrada nas suas fotografias de uma elegância melancólica.

Foi a deusa das deusas, a esfinge das esfinges, o mistério dos mistérios. Madame Grès brilhou no universo exclusivo da alta-costura parisiense, deixando como legado uma obra marcada por uma incessante busca da beleza absoluta. Os seus longos vestidos drapeados, feitos de mestria técnica e de obsessão, constituem uma profunda reflexão sobre a moda, o tempo e a memória. Quem escreve sobre a vida e a obra desta grande couturière é Anabela Becho, curadora e investigadora da área da moda.

Henning Lundkvist é um artista visual e escritor sueco que vive na capital da Dinamarca. Através da Kharabat, «a última casa de chá do seu género», o autor estabelece uma estranha ligação entre duas cidades tão distantes e tão diferentes: Copenhaga e Cabul. De repente, ficamos mergulhados num universo de sons (musicais também), sabores, imagens e tecnologias, em que espaços e tempos se cruzam numa sinestesia que nos faz viajar, imaginar, divagar. E assim esta «Vista de Delft» se torna uma pintura móvel em que as formas, as figuras e as cores são perseguidas pela ameaça subterrânea das águas.