Lembro-me da torrente de sensações que tive ao assistir num sábado, 19 de Novembro, à estreia em Espanha de Le Grand Macabre — ópera de György Ligeti escrita em 1978 e hoje convertida num pilar fundamental da história da música — no Teatro del Liceu, em Barcelona, sala que, dadas as circunstâncias políticas do país, talvez deixe de considerar-se espanhola no futuro. Era uma produção dos Fura dels Baus. O evento não passou de uma efeméride musical quase inexistente, porque a dita estreia ocorreu durante o dia de reflexão das eleições antecipadas de 20 de Novembro, convocadas em 28 de Julho desse ano. Num mundo, o da ópera, onde as programações são fechadas com anos de antecedência, o acaso fez com que a data de um evento eleitoral coincidisse com a estreia de u ma obra de forte carga política. Além disso, era muito claro que a ferocidade da crise económica iria empurrar a direita para o poder apenas poucas horas depois da récita, como assim foi, o que aquecia ainda mais o ambiente.
Em 2018, mesmo estando programada com quase dois anos de antecedência, uma nova antecipação eleitoral fez com que a estreia espanhola da obra Der Diktator, de E. Krenek, no Teatro de la Maestranza, em Sevilha, coincidisse com o fim da campanha para as eleições na Andaluzia, novamente num momento crucial da política europeia e espanhola, com o debate da autonomia catalã em cima da mesa, o conflito territorial que o Brexit supõe para os trabalhadores de Gibraltar que vivem na fronteira com La Línea de la Concepción (Cádis) e a subida do fascismo pairando sobre as nossas cabeças. Agora sou eu quem dirige a produção.
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