Acontece-me com frequência sentir a necessidade de voltar a folhear um livro logo após o ter terminado, como se alguma coisa estivesse a faltar. Faço o que fazia quando me preparava para um exame nos tempos de escola: releio em voz alta, sublinho e, num caderno, anoto o que achar importante. No que diz respeito às leituras, chego sempre atrasada, não me importo de reler e nunca acompanho a moda do momento. Cada livro tem o seu tempo e mais do que uma forma de o interpretar, e, embora tente envolver-me com livros que penso que deveria ter lido, raramente funciona.
A obra de Jorge Queiroz é o livro que leio continuamente: um trabalho artístico fiel a si próprio; a forma de descrever o prazer estético. O amante ideal das suas obras quiçá precise de padecer de insónia e ter tempo de ver e rever a mesma obra durante horas até à exaustão. Ou talvez precise de estar disposto a ser levado para os mistérios da alma, ou necessite daquela suavidade sublime que advém do conhecimento da pintura de mais do que uma época (desde a pintura medieval, o renascimento italiano, Bosch, passando por Artemisia Gentileschi, Velázquez, Goya). A obra de Jorge Queiroz está impregnada da convicção de que o que se ama perdura, da procura da luz tanto como narração quanto como presságio.
Entre quem fica e quem parte rapidamente, ainda há quem reflicta sobre como lembrar e pensar o apocalipse visual de um trabalho ricamente estratificado, que recompensa o tempo dispensado à sua frente.
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