Existirá uma arquitectura do ócio? Não apenas uma arquitectura para os ociosos, mas uma arquitectura que produza, fomente, preserve e intensifique a ociosidade? Ou será uma contradição nos termos falar em «arquitectura ociosa»? Afinal de contas, a arquitectura é um pôr-ao-trabalho. Ela define os espaços para a actividade. Qualquer espaço definido — e a definição pode ser tão delicada como uma linha pontilhada ou uma mudança na cor, na luminosidade, na textura, na temperatura, na humidade, no som ou no nível do piso — promove actividade, mesmo que a acção seja relaxamento, sono, meditação, isolamento ou fuga. Não se trata simplesmente de coreografar as acções moldando, encadeando ou encaixando espaços. O espaçamento é o que torna a acção possível, é ele que a inspira, ou até que a impõe. A arquitectura é possivelmente o preciso oposto da ociosidade.
Em bom rigor, a arquitectura é a possibilidade da actividade. Uma «sala de jantar», por exemplo, não é apenas o espaço designado para jantar, mas a sua possibilidade. Jantar, enquanto algo distinto de comer, só pode acontecer num determinado espaço. Jantar fora de portas requer que se trate parte do exterior como uma sala. Requer arquitectura. Esta possibilidade de actividade suscitada por um espaço precede e acompanha qualquer acção. Ou, ao contrário, as actividades de jantar imaginadas, num certo sentido, decorrem sempre nos espaços a elas dedicados. A ideia do jantar condiciona qualquer acto de jantar ou não-jantar no mesmo espaço. Dormir numa mesa de jantar não é o mesmo que dormir noutra mesa qualquer. Sexo em cima da mesa de jantar — não é por acaso que é um elemento central de tantos filmes — retira o seu impacto da intrusão na ideia do jantar e de todos os seus protocolos, equipamentos, simbolismos e civilidades altamente estruturadas. Inversamente, um acto de jantar que não viole pelo menos parcialmente uma expectativa relativa ao jantar talvez nem chegue a ser um acto, da mesma maneira que a respiração só é uma acção consciente quando é difícil, ruidosa, malcheirosa, irregular, aumentada, amplificada por um microfone, interrompida, ou quando pára.
Como afirmou Walter Benjamin em 1935, a arquitectura é habitualmente recebida «na distracção». Não é um objecto escrutinado com uma atenção focada e consciente, mas sim um ambiente que habitualmente se detecta apenas de maneira inconsciente. Tal como água para um peixe, ela envolve a nossa espécie hapticamente em todos os momentos, e tem-no feito desde o início «como uma força viva». Outras artes chegaram e partiram. «Porém, a necessidade que o homem tem de um tecto é permanente. A arquitectura nunca foi inútil.»1 É invisível precisamente por ser tão activa. Talvez um espaço só seja apercebido enquanto tal na medida em que se desvia das expectativas que instalou. Em contrapartida, actos que desligam do espaço, como a meditação, paradoxalmente requerem a construção de um espaço particular usando o corpo e o ritmo da respiração ou de cânticos, antes ainda do arsenal de tapetes e bancos, dos nichos tranquilos ou dos edifícios religiosos. O sono profundo, é claro, tem as suas próprias arquitecturas elaboradas.
A dança entre arquitectura e actividade é ela mesma um turbilhão contínuo. A arquitectura é em grande parte um repositório de linhas rectas, mas não é por isso que a sua relação connosco é linear. Para crer que a arquitectura coreografa a actividade de uma maneira simples é preciso não estar interessado nela.
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