Assunto
Cidade, Campo

Pensar hoje a cidade, as suas metamorfoses, as suas manifestações exasperadas, como são as megalópoles, os seus sinais mais eloquentes, que uns lêem como decadência e outros como uma enorme vitalidade, é um exercício que nos coloca num terreno que tem abertura para todos os domínios da vida política, social e cultural. A cidade é um tema de âmbito vastíssimo e imponente. No nosso tempo, ele faz apelo especial a uma aceleração do fenómeno urbano e a uma expansão ilimitada da cidade que segue a par, e segundo a mesma lógica, do esvaziamento total do campo, que é o outro termo de uma dicotomia que parecia ter sido remetida para as representações literárias ou para um imaginário povoado de relíquias. Porém, algumas condições e circunstâncias actuais — a pandemia, as possibilidades de praticar o nomadismo digital, a gentrificação que abrange um círculo urbano cada vez mais largo, a lógica económica que reserva a cidade para os ricos e os visitantes — trouxeram o campo para um espaço onde dantes só parecia existir a cidade e reactivaram a clássica dicotomia, num tempo em que as alterações climáticas estão a provocar catástrofes ambientais que obrigam a repensar a cidade e o campo em conjunto e não como uma polarização que o modernismo muito incentivou.

Neste dossier «Cidade, Campo», apresentamos imagens de dois artistas. Thomas Struth é um dos fotógrafos alemães com maior projecção internacional. Entre as séries mais reconhecidas do seu trabalho, conta-se uma sobre ruas de cidades, que a série deseja resumir numa só fotografia: Unconscious Places. Dela, Struth escolheu para a Electra as imagens deste «Assunto». Com uma obra de grande originalidade, o pintor português João Hogan pintou obsessivamente a vastidão e a dureza da paisagem, a sua aridez e o seu silêncio, dando-lhe muitas vezes uma ressonância metafísica. São algumas dessas imagens que se mostram neste dossier. Estas fotografias de Struth e estas pinturas de Hogan têm em comum a ausência de pessoas, propondo ao espectador uma contemplação que melhor dá a ver os fundamentos estruturais da cidade e do campo.