Portfolio
Stefan Kürten: Pink Turns to Blue
Gregor Jansen

Stefan Kürten é um conceituado artista alemão que tem exposto as suas obras em instituições e galerias da Europa e dos EUA. Foi professor de pintura na Kunstakademie Düsseldorf e é hoje professor convidado Escola de Arte e Design da Alfred University de Nova Iorque. Neste portfólio que criou para Electra, o artista desenvolve alguns dos temas e motivos mais presentes na sua obra. No ensaio que escreveu propositadamente para acompanhar este trabalho, o reputado curador e crítico Gregor Jansen, director da Kunsthalle Düsseldorf, fala da inspiração que a obra de Kürten encontra no cinema e da estranha relação entre arquitectura, inocência e terror. E também das imagens e das histórias que a partir delas contamos.

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Stefan Kürten, Pink Turns to Blue [Rosa transforma-se em azul], 2019

A questão da necessidade e da actualidade da pintura é essencial para Stefan Kürten. O que lhe interessa na pintura é a reflexão e a descoberta, o acto de tornar visível o invisível. O que está em causa é algo como uma «legitimação» da existência das pinturas, bem como as dúvidas que elas suscitam. Na sua busca de imagens figurativas a partir da colagem de fotografias e outros suportes, a construção de um arquivo consciente ou inconsciente desempenha um papel decisivo — a procura das memórias culturais que alimentam as nossas imagens constitui muitas vezes o ponto de partida do seu fascinante universo visual.

Stefan Kürten dedica-se há já muitos anos, de modo consistente, a um conjunto de temas relacionados com a vida privada: bungalows nos subúrbios e os seus jardins, com trilhos cuidadosamente delineados, canteiros opulentos e piscinas bem proporcionadas; vivendas de tijolo muradas em cenários idílicos; prédios de rendimento, que nada têm de espectacular, nas vias anónimas que dão acesso às nossas cidades. Os temas das suas imagens revelam uma história da arquitectura que é também a nossa história da modernidade.

A necessidade de protecção contra os perigos da natureza condicionou desde sempre a história da humanidade. Muito antes de abandonarem o nomadismo, para se fixarem num único lugar, já os homens procuravam formas de proteger-se. Quando começaram a tornar-se sedentários e a construir habitações duradouras, surgiu uma necessidade ainda maior de organizar esses espaços. E logo a definição de casa foi muito além de uma mera «gruta onde passar a noite». Dado que este novo sentido emocional converteu o espaço de recolhimento privado num lar, não é de admirar que as casas se tenham transformado, de modo aparentemente automático, em superfícies de projecção para os sonhos e as concepções de felicidade de cada um.

Mas o facto de a situação inversa também ser possível — isto é, de as casas se tornarem superfícies de projecção para a solidão, a angústia e a depressão, ou até mesmo lugares habitados por monstros e palcos de homicídios — é também fruto do furor quotidiano da humanidade e da sua história. O lar acolhedor e seguro conduz, pois, ao trauma do isolamento psíquico, volve-se numa prisão ao serviço de fins por vezes brutais.

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*Tradução de Bernardo Ferro